terça-feira, 17 de novembro de 2009

  • A CUECA DA NATUREZA

    Tertuliano explica as razões porque se tornou cristão. Elas sempre me pareceram perceptíveis e compreensíveis à luz do mundo em que vivo… mas difíceis de compreender no seu tempo, por acarretar alguma irracionalidade existencial. Era, se assim se pode dizer, um elo dissociado da minha compreensão da sua pessoa, do seu pensamento, das suas opções e do seu tempo. Hoje, como que por uma epifania da razão, descobri o elo. Entendi. E é tão óbvio, tão elementar, tão patente — tão frio…

    Tem razão Vargas Villa, sobre a consciência das épocas. E lembro-me de José Martí, da sua reacção a morte de
    Garfield — não o gato, mas aquele que foi Presidente dos Estados Unidos da América: James Abraham Garfield — e do que dizia, no longínquo dia 1 de Outubro de 1881 (em artigo publicado no La Opinión Nacional, Caracas, 19 de octubre de 1881): «Quando se é testemunha das grandes explosões de amor da humanidade, sente-se orgulho de ser-se homem, assim como quando se presencia as suas prostrações ou fúria dá vergonha sê-lo. A morte é útil, a virtude é útil, a desgraça necessária e reparadora, porque desperta nos corações que a presenciam nobres impulsos de as eliminar. […] A dor alimenta, a dor purifica, a dor nutre.»

    A guerra corpo a corpo entre a lei do amor e a lei do ódio, como dizia José Martí, é contínua, como a natureza: todos os dias morrem e nascem coisas, sentimentos e pessoas, pessoas que morrem na luz e sem ira — digo eu. No plano da razão, também.
    «Sempre quis olhar para o meu caixão, ver-me exposto ao Mundo… saber onde andam as lágrimas. Curiosidade satisfeita. Vi a cueca da natureza» diz-me o meu poeta.

    Imagem: Mahmoud Ali, 8 anos (escola de Al-Qabs — Ramallah, Palestina)

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